29 de jun. de 2008

Revolução Espanhola

Antes do início da partida, já sabíamos quem seria o maior vencedor do dia: O futebol. Isso é dito porque chegaram à final da Eurocopa duas seleções que mereceram estar lá, porque apresentaram qualidades para isso. A Alemanha foi bem na fase de grupos, só tropeçando no jogo contra a Croácia. Na fase de mata-mata, ganhou de Portugal com autoridade, apresentando um futebol ofensivo, rápido, eficaz. Venceu a Turquia mostrando enorme força de vontade e dedicação. Quem também chegou foi a Espanha. A Espanha? É, essa mesmo. Equipe com a melhor campanha do torneio, a seleção espanhola chegou invicta à decisão, jogando um futebol bonito, de garra e belos passes, além de possuir a melhor dupla de ataque da competição, formada por Torres e Villa. Portanto, ambas mereciam estar no estádio Ernst-Happel, em Viena.



Não estamos aqui idolatrando o futebol europeu ou a Euro em si. A seleção brasileira é totalmente capaz de jogar no mesmo nível, e até melhor do que fizeram Espanha e Alemanha, justamente porque tem talento para isso. A questão portanto não é em relação à técnica, mas à mentalidade. Seleções como Holanda, Alemanha e Espanha já perceberam que a retranca não é mais interessante, que ela é previsível e pouco eficaz. Jogar recuado para não tomar gols é perigoso. A idéia agora é atacar, pressionar, sem deixar chances para o adversário se estabilizar e armar jogadas. Como sempre deveria ter sido.

Os 10 primeiros minutos foram dominados pela Alemanha, que se movimentava, tocava melhor a bola e apertava a saída de bola do adversário. Porém, a maré virou. Na tentativa de cruzamento de Iniesta, a bola desviou em Metzelder e foi na direção da meta alemã, porém Lehmann estava ligado e espalmou. Após esse lance, quem tomou a rédia do confronto foram os espanhóis, partindo para cima sempre em velocidade. Aos 21 minutos, quase que o ímpeto resulta em gol. Sérgio Ramos cruzou na área e Fernando Torres acertou uma cabeçada no pé da trave, mas a bola não quis entrar.



Vendo que a "blitz" espanhola logo alcançaria os seus objetivos, os alemães resolveram reagir, principalmente nas jogadas pela esquerda de seu ataque, protagonizadas por Podolski e Lahm. Como sobe ao ataque o pequeno camisa 16 alemão. Ah, a posição dele? Lateral-esquerdo. Tomara que o Dunga pegue a dica.

A ofensiva espanhola continou, como notou-se no chute rasteiro de Fábregas, que Lehmann caiu bem e agarrou. As ações começaram a se equilibrar, até "aquele" momento. Aquela fração de segundos que cala e ensurdece ao mesmo tempo. Aqueles instantes nos quais até Cronos pára e observa, que enlouquecem qualquer amante de futebol: o gol. Xavi deu um passe em profundidade para "El Niño" Torres, que ganhou a disputa de bola com Lahm, e tocou por cima na saída do goleiro alemão.



A Alemanha não sentiu o impacto. Continou perseverante, como sempre faz o povo alemão, não importando o grau do desastre. Lutaria mesmo que para vencer fosse necessário sangrar.



A Espanha atuou no tempo inicial num ofensivo 4-1-4-1, sendo Marcos Senna o homem de meio de campo mais recuado, e a linha de quatro mais à frente foi formada por Iniesta e David Silva nas pontas e Xavi e Fábregas mais centralizados. Xavi jogou muito bem nesses primeiros 45 minutos. Já Cesc, nem tanto. Os alemães estavam orientados a partir da tática 4-2-3-1, com Podolski, Ballack e Schweinsteiger municiando o artilheiro Klose. Porém, o trio não jogou o que se esperava dele.

O segundo tempo começou com os espanhóis pressionando os germânicos. Aos 8 minutos, Xavi quase marcou em um arremate cruzado, mas o eterno Lehmann desviou a bola para fora. No lance seguinte, em uma cobrança de escanteio, a redonda voou por cima da área e parou nos pés de David Silva, que mandou um chute que atravessou a frente do gol alemão, mas ninguém concluiu a jogada. A essa altura do jogo, já podia-se responder a seguinte pergunta: Porque a Espanha está dominando? Porque ataca com mais jogadores; Sérgio Ramos avança constantemente; a troca de passes da Fúria é rápida e envolvente; e porque Torres joga posicionado entre os zagueiros, esperando um passe longo para sair em velocidade.

Após a entrada do brasileiro naturalizado Kevin Kuranyi, a seleção alemã melhorou um pouco. Um sinal dessa melhora foi o chute de Ballack, aos 14 minutos. Alías, Kuranyi só entrou em campo para distribuir pontapés, como fez na dividida com o outro brasileiro, Marcos Senna. Com a presença de mais um homem de área do time adversário além de Klose, a Espanha foi obrigada a recuar. Mas recuar não significa deixar de atacar. Mesmo tirando Fábregas e David Silva. A Fúria quase marcou o segundo em 3 oportunidades: numa cabeçada de Sérgio Ramos; num chute de Iniesta; e numa jogada em que Marcos Senna não alcançou a bola, jogada essa que ele mesmo começou. Os espanhóis dominavam o meio-campo, tocavam a bola com rapidez e qualidade. O maior exemplo disso aconteceu aos 46 minutos, quando a Espanha botou a Alemanha na roda, literalmente. Eles mostraram que o passe, um dos fundamentos do futebol, ainda é valorizado, mesmo como o legado de marcação deixado pela última Copa do Mundo.

Parabéns à Espanha, bicampeã da Eurocopa, com todos os méritos. Tudo bem que o título demorou para vir de novo (44 anos), mas foi conquistado por um ótimo time. Que bom que uma geração talentosa como esta, que conta com o grande Casillias, Fábregas, Puyol, David Villa e Torres, além de bons jogadores como Xavi e Iniesta, deixou a sua marca na história da Europa.



Parabéns também para a seleção alemã. Infelizmente, no final, só pode haver um vencedor. Mas a continuidade que o técnico Löw deu ao trabalho de Klinsmann foi notório. A Alemanha fez uma Eurocopa muito boa, compatível com a sua história. A base da equipe que foi terceiro colocada em 2006 manteve o futebol de alto nível nesta Euro. Lehmann está entre os melhores goleiros do mundo. Lahm é um lateral que agrada a muitos treinadores. Ballack, apesar dos sumiços, merece destaque. Podolski e Schweinsteiger são muito bons jogadores, e Klose continua sendo um atacante de peso.



Alguns já dizem que o futebol apresentado pelos espanhóis, holandeses e alemães é momentâneo, que a euforia em relação a eles é indevida. Talvez, mas como não considerar digna a exibição espanhola, por exemplo, se levarmos em conta o futebol burocrático que vinha sendo praticado há alguns anos por todo o mundo, e que infelizmente ainda é modelo para a nossa seleção brasileira?

Tomara que a tendência do futebol a partir de hoje basei-se nessa Euro-2008. Que seleções e times busquem incessantemente o gol, a vitória. Que o passe, o drible, e o gol sejam os principais tópicos dos treinos. Tomara que as coisas continuem melhorando até a Copa de 2010. Para fechar, uma foto da festa espanhola, que ainda deve durar muitos dias. Obrigado Aragonés, por montar um time que joga para frente. Que as estruturas do futebol-força e defensivo sejam derrubadas, e que sejam erguidos novos pilares, baseados no futebol-arte, na técnica, na habilidade, no passe, no drible, e na alegria.



7 comentários:

Canhoto disse...

Acho que foi uma boa competição. Jogos emocionantes, times jogando pra ganhar...

E realmente levou quem foi melhor. O jogo final teve momentos truncados, mas é natural que em uma final os times tenham mais cuidado, pois há muita coisa em jogo.

É bom pra mostrar pra esses caras chatos que o futebol não morreu lá na década de 70 junto com o rock n'roll. Aliás, nenhum dos dois morreu.

O time espanhol mostrou talentos em todas as posições.
O goleiro dispensa comentários, a zaga, apesar de baixa , trouxe segurança ( Marchena costuma jogar mais "violentamente" no Valencia e Puyol foi só a raça que costuma ser) e Sergio Ramos é sempre uma boa opção.
O meio de campo é forte em habilidade, todos sabem jogar, embora não tenham um grande porte físico, mas a técnica acaba prevalecendo. Só não sei porque Fábregas não é titular.
E o ataque é formado por uma dupla muito individualista, porém que faz gols, e os gols deles acabaram carregando o time espanhol.

Enfim, um bom resultado para o futebol.

Canhoto disse...

Mas não posso esquecer de uma coisa:

MELHOOOOOOOOOOR JOGO DE TODOS OS TEMPOS! QUEEEEE JOGO! SENSACIONAL É A EUROCOPA NA RECORD, OS MELHORES JOGADORES DO MUNDO NA SUA TELA!

LÁ VEM A ESPANHA, LATERAL PELA DIREITA!

Rodrigo Paradella disse...

Pena que perdi o jogão pra ver uma pelada no maraca...

Fazer o que? ahah

James M. Barrie disse...

Infelizmente, não acompanhei a competição com a atenção que ela merecia; assisti a poucos jogos inteiros.
No geral, vi apenas os melhores momentos de alguns jogos.
Seleções como Holanda e Rússia me impressionaram positivamente.
Entretanto, é frustrante que não tenham conseguido manter esse futebol nos jogos decisivos.
Portugal me parece ser um tanto superestimado. Tem o Cristiano Ronaldo de craque e os outros são, no máximo, bons jogadores. O Felipão é um grande técnico, mas agora é o Chelsea quem desfrutará dessas virtudes.

Quanto á final, a Espanha obviamente mereceu ganhar. É um bom time, apesar de não ser essa Coca-cola toda. Joga bonito, mas nada de excepcional.
O jogo objetivo da Alemanha dessa vez não foi tão eficiente, e me impressionei com o fato de os caras não terem tido a frieza que lhes é habitual naqueles quinze minutos finais de jogo, em que se desesperaram.

O balanço, a princípio, é positivo.
Vamos torcer pra que essas seleções que apresentaram um bom futebol se mantenham num bom nível.

Ainda assim, a Seleção Brasileira (e não esse bando comandado pelo Dunga) teria plenas condições de derrotá-las todas.

Aliás: Marcos Sena merecia aquele gol no finalzinho. Ele e Xavi foram os melhores em campo ontem, e ouso dizer que foram os melhores da Euro.

Anônimo disse...

Mais uma vez, sou incapaz de tecer comentários futebolísticos. Mas, quanto ao texto, arrisco-me: maravilha, Rodrigo!

Dá gosto de ver o esmero e a dedicação com que vocês cuidam do blog. Sou fã mesmo.

Beijinho.

Etchatz disse...

Foi muito bom ver essa Eurocopa, mesmo não tendo visto jogos importantes como a final. Jogos bem jogados, futebol ofensivo como a muito não se via, principalmente na Europa.

Com direito à narração efusiva do éder luís na record: "Esse é melhor jogo de todos os tempos!", "Gatuuuuuuuuso, o craque de toda uma geração!!!!!", "Mas que bela peruuuuca do técnico alemão!", entre outros comentários épicos, com direito a nota zero da Patrícia Kogut, no O Globo.

Felipe Schmidt disse...

Nem vi o jogo direito, mas acho que o título ficou em boas mãos. Só a atuação da Espanha contra a Rússia já teria bastado para eu me certificar de que o título seria justo.

Acho que o melhor legado dessa Eurocopa foi o futebol ofensivo. Todos os times que se destacaram jogaram de forma envolvente, bonita de se ver. Aqueles que se prenderam à burocracia ficaram pelo caminho.

Legal também a Turquia, que operou vários milagres durante a competição. Até na semifinal chegou a assustar, mas não deu.

Enfim, boa Eurocopa. Espero que a seleção Brasileira volte a ser adepta do futebol ofensivo, porque pode jogar num nível tão ou mais alto quanto as européias.

Ah, e o Marcos Senna hein? Tem vaga até no Brasil.